Elaborar projetos para se inscrever em editais ou buscar outros apoios é uma estratégia que tem feito as organizações da sociedade civil fortalecer o próprio trabalho, além de garantir o andamento de atividades, de acordo com a missão de cada grupo.
Contudo, as instituições têm dúvidas sobre como elaborar um bom projeto em todas as etapas. Esse foi um desafio relatado por diferentes organizações indígenas apoiadas pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos.
A partir das visitas de monitoramento, realizadas por assessores de projetos a grupos apoiados pelos editais da fundação, os integrantes dos grupos apoiados contaram que gostariam de descrever, de forma assertiva, ações que possibilitem o impacto almejado para financiadores.
Para ampliar o conhecimento e auxiliá-los a aplicar a experiência de campo, na prática da escrita de um projeto, o Fundo Brasil de Direitos Humanos promoveu, em São Paulo, a Oficina de Elaboração de Projetos, em parceria com o Instituto Meraki e colaboração da Interamerican Foundation e a Rede Comuá.
No dia 1º de março, nove organizações indígenas, das cinco regiões do país, apoiadas pelo edital Em Defesa dos Direitos do Povos Indígenas, participaram do encontro. O edital é desenvolvido no âmbito da Aliança entre Fundo.
Ana Valéria Araújo, superintendente do Fundo Brasil, falou aos participantes sobre os objetivos da fundação ao promover esses espaços de aprendizado e trocas.
“Esse encontro é extremamente importante para nós, porque para agir, a gente precisa ouvir o campo, para poder pensar no que é prioritário. Todas as lutas por direitos humanos são importantes, mas quando a gente não tem dinheiro para todas as causas, a gente precisa ser estratégico”, disse a superintendente. “A gente chegou à conclusão de que também é uma riqueza imensa, além do apoio financeiro, a gente promove oportunidade de troca para interação e aprendizado entre as organizações para esse diálogo que potencializa e fortalece o trabalho de vocês. E essa também é uma missão nossa”.
Não por acaso, a oficina aconteceu no recém-inaugurado Museu das Culturas Indígenas, localizado no bairro Água Branca, zona oeste da capital paulista. O museu é um local de diálogo intercultural, de pluralidade e encontros entre povos indígenas e não-indígenas para preservação da memória de diversos povos originários.
Ainda em processo de construção, o espaço é uma conquista dos povos indígenas, aberto para que o público entre em contato com as histórias que construíram o Brasil.
Elaborando um projeto
As atividades práticas da oficina foram conduzidas por Luciana Martinelli e Rafael Oliva, que durante um dia inteiro, elaboraram e apresentaram as principais questões, de diferentes financiamentos pelo Brasil, para apoio a organizações indígenas: da concepção ao final de avaliação de um projeto.
“Além de ser algo novo na minha vida, essa oficina foi uma experiência inesquecível. Porque eu sei falar muito bem, mas na hora de escrever um projeto, passar para o papel, eu tenho dificuldade. E, conforme a gente estava ali, criando o projeto, eu já estava tendo ideias para novas propostas. Eu vou levar isso para o meu povo e para a minha vida”, disse Marlene Kulina, da Associação de Mulheres Indígenas de Eirunapé. A organização surgiu em 2018 e conseguiu um primeiro apoio financeiro por intermédio do edital do Fundo Brasil.
Milena Kanindé e Jorge Tabajara participaram da oficina representando a Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Ceará. Durante o dia de atividade, o grupo conseguiu estruturar um projeto completo e está pronto para se inscrever em novos editais.
“Eu quero agradecer ao Fundo Brasil. Saio daqui entendendo a diferença entre executar um projeto e elaborar um projeto. Quando a gente escreve o projeto, tem a sensibilidade de entender os anseios dos nossos povos. A gente tem o domínio do que precisa fazer e se aquilo vai ser possível ou não de alcançar”, relatou Milena Tabajara. “Eu vou sair daqui uma pessoa diferente e disposta a tentar crescer, buscando mais conhecimentos e financiamentos para os povos indígenas do meu estado”.
Durante a oficina, a Juventude Xokleng, do estado de Santa Catarina, elaborou um projeto para expansão das ações de comunicação dos jovens indígenas utilizando as redes sociais. Um desejo da organização é ter mais ferramentas tecnológicas para isso.
“Foi muito bom estar aqui e encontrar parentes de outras partes do Brasil e com pessoas de outros movimentos sociais. Esses encontros são muito importantes para que a gente possa trocar e se fortalecer também. Eu adorei ter esse tempo, na vida tão corrida, para pensar em como conseguir mais recursos para os nossos projetos”, disse Txulunh Gakran, da integrante da Juventude Xokleng.
A partir do apoio que a organização recebeu do edital do Fundo Brasil, a jovem acredita que pode conseguir ainda mais apoio para as atividades de seu território.
“A gente, enquanto juventude, não tinha ainda um espaço consolidado dentro da nossa terra, a gente não era muito respeitado, exatamente por ser jovem, e duplamente, por ser mulher. Então esse apoio do Fundo Brasil foi fundamental para que a gente pudesse ocupar espaços dentro da nossa comunidade. Isso foi tão revolucionário lá dentro, que hoje já não existem espaços ou decisões sem juventude e sem mulheres lá dentro. Agora sabemos que podemos ir além”, finalizou Txulunh.