O debate sobre os desafios para sensibilizar a população sobre a importância da atuação da sociedade civil organizada na construção de um país mais igualitário e democrático esteve no centro da participação do Fundo Brasil e da Rede de Filantropia para a Justiça Social na 10ª edição do Festival ABCR – Associação Brasileira de Captadores de Recursos, realizado de 6 a 8 de junho em São Paulo.
Na opinião de Ana Valéria Araújo, coordenadora executiva do Fundo Brasil, superar esses desafios passa por criar novas narrativas capazes de fazer a população de forma geral a compreender a relevância do que é realizado pela sociedade civil organizada.
“Sem esse trabalho a gente não teria os direitos que temos hoje”, disse.
Ana Valéria foi uma das convidadas da mesa de debates Investimento Social Privado: para além do apoio a projetos. Além dela, a mesa contou com as presenças de José Marcelo Zacchi, do Gife, que atuou como moderador; e Patrícia Lacerda, do Instituto C&A, debatedora.
Para a coordenadora do Fundo Brasil, a cultura de doação precisa passar por investir na comunicação sobre a relevância dos atores da sociedade civil organizada.
Durante o debate, ela falou sobre o trabalho realizado dentro do universo da Rede de Filantropia para a Justiça Social, rede formada por fundos e fundações comunitárias com atuações similares.
“É fundamental dizer que somos prioritariamente grantmakers”, afirmou. ‘Captamos recursos para poder financiar. Não temos uma fonte de renda, uma mantenedora. Então, tudo que a gente faz depende de nossa capacidade de buscar recursos”.
Grantmakers são as organizações privadas, sem fins lucrativos, doadoras de recursos para programas e projetos sociais.
Ana Valéria ressaltou também o fato de o Fundo Brasil ter em sua governança ativistas de direitos humanos que discutem e escolhem os projetos apoiados. São pessoas ligadas ao campo das organizações e que conhecem profundamente os temas com os quais a fundação trabalha.
Além do apoio com recursos, há o trabalho de fortalecer os grupos de direitos humanos por meio de oficinas de capacitação, encontros anuais e debates políticos.
Nos últimos anos, o Fundo Brasil começou a desenvolver a capacidade de promover intercâmbios entre os diversos grupos apoiados, com o objetivo de criar oportunidades para que eles encontrem possíveis parceiros em suas lutas.
Um exemplo são as populações indígenas e quilombolas que, eventualmente, podem juntas fazer uma abordagem fortalecida em relação ao direito à terra.
Outro destaque feito durante o debate foi o investimento em atividades emergências, principalmente para a proteção de defensores e defensoras de direitos humanos.
Relatório
Outro debate voltado ao tema aconteceu durante a plenária Construindo uma cultura de filantropia, com a moderação de Patrícia Lobaccaro (Brazil Foundation) e as participações de Graciela Hopstein (Rede Filantropia para a Justiça Social), Benjamin Bellegy (Wings), Lindsay Marciniak (CCS Fundraising) e Lucas Tomilheiro Sancassani (Amigos da Poli).
Durante a plenária, foi lançado o relatório Filantropia no Brasil, parte de uma série produzida pelo Philanthropy for Social Justice and Peace – PSJP sobre a atual situação da filantropia em vários países ou regiões.
A publicação é baseada em entrevistas de atores estratégicos na área da filantropia para a justiça social e revela um gap entre o campo e o crescimento da sociedade civil organizada, o que faz com que o setor não seja sustentável.
O relatório analisa a dinâmica do setor e oferece uma visão geral da filantropia no Brasil de hoje, com destaque para as inovações e novas iniciativas.
A Rede de Filantropia para a Justiça Social, o Fundo Brasil e a Wings são co-editores da publicação.
Para ler o relatório completo, em inglês, clique aqui.
Para ler o resumo em inglês, clique aqui.
Para ler o resumo em português, clique aqui
Iceberg
Outra participação no festival ocorreram por meio de Débora Borges, assessora de relacionamento com a sociedade do Fundo Brasil, que moderou o debate Comunicação e Captação de Recursos, representando a Rede Narrativas.
Débora fez parte do comitê científico do festival.
Além disso, Mafoane Odara, diretora do Fundo Brasil, falou sobre sua trajetória durante o festival e apresentou estratégias para a solução de problemas complexos na palestra Sob a ponta do iceberg, realizada no último dia do evento.
Convidada da sessão chamada Histórias Inspiradoras, Mafoane discorreu sobre os padrões de comportamento que levam os negros e as mulheres, por exemplo, a serem sempre tratados da mesma forma e discutiu as estruturas sistêmicas que levam os padrões a serem repetidos.
Um exemplo são as delegacias especializadas em atendimento às mulheres, desenhadas para não acolher.
“Se não mudar a estrutura, não muda a forma de tratamento”, disse.
A ativista defendeu que as pessoas saibam o que devem fazer a partir de seu lugar no mundo para defender a igualdade e serem agentes da transformação.
Por exemplo, um homem pode não sentar em uma mesa de debates que não tiver 50% de mulheres. Outra dica, para todos, é conseguir reconhecer que muitas vezes ocupamos o lugar de opressor.
Por fim, uma frase da diretora do Fundo Brasil marcou o evento lotado de pessoas que acreditam em dias melhores.
“Deixemos o pessimismo para dias melhores”.