No final da década de 1980, um pequeno grupo formado por mulheres e homens negras e negros começaram a debater no Pará a necessidade de resistência por parte dos excluídos das políticas públicas estatais. Entre essas políticas excludentes estava a polêmica construção da rodovia Transamazônica, que provocou grande impacto na região.
Essas pessoas eram sobreviventes do modelo de colonização imposto pelo governo federal desde a década anterior e iniciavam ali o movimento de resistência negra, articulado com outros movimentos populares, sociais e sindicais.
Essa é a origem do CFNTX – Centro de Formação da Negra e do Negro da Transamazônica e Xingu, organização apoiada pelo Fundo Brasil e que luta pelo fortalecimento das políticas públicas afirmativas nas áreas de educação, saúde, moradia e enfrentamento à violência contra mulheres.
No final de julho, o Fundo Brasil fez uma visita de monitoramento ao CFNTX, em Altamira (PA), para debater o projeto apoiado, chamado “A carne mais barata vendida no mercado é a negra: denunciando e combatendo a tortura, o extermínio e a prisão arbitrária de jovens negros no contexto dos grandes projetos do capitalismo”.
O apoio foi concedido por meio do edital “Direitos Humanos e Justiça Criminal: Enfrentando a Prisão Provisória e o Encarceramento em Massa no Brasil”, realizado pelo Fundo Brasil em parceria com a Fundação OAK e o Instituto Betty e Jacob Lafer.
O projeto tem como principal objetivo a redução do número de pessoas encarceradas provisoriamente em Altamira, localizada em uma região recentemente impactada pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, além das políticas econômicas governamentais anteriores.
“Hoje, em Altamira, os movimentos sociais começaram a voltar por causa da violência que cresceu, com mais pessoas que vieram de fora, principalmente homens”, resumiu Maria Helena de Araújo Silva, presidente do CFNTX, durante a reunião de monitoramento.
As atividades apoiadas incluem reuniões com o Ministério Público e Defensoria Pública para criar estratégias de enfrentamento a um dos problemas mais graves de Altamira: os assassinatos de jovens, muitos deles atribuídos a acertos de contas entre grupos rivais que passaram a viver próximos após os reassentamentos realizados devido à construção da hidrelétrica.
Uma das primeiras ações do grupo foi a realização de uma audiência pública que teve como um dos resultados um documento com propostas para dois grupos vulneráveis na cidade: os jovens e as mulheres.
Os ativistas também realizaram nas ruas de Altamira a campanha “Basta! Não à Tortura, Extermínio, e Prisões Arbitrárias de Jovens Negros!”.
Entre as dificuldades enfrentadas está a naturalização da violência contra pobres e negros, inclusive por parte da mídia televisiva. E também o preconceito de parte da população, manifestado inclusive nos momentos em que os ativistas estão mobilizados nas ruas da cidade.
Para a advogada Dandara, que atua no CFNTX, a sociedade legitima a violência oficial contra pretos, pobres e periféricos.
E é isso que precisa ser enfrentado diariamente.
Fundo Brasil
O Fundo Brasil é uma fundação independente, sem fins lucrativos. É um elo entre doadores e organizações locais. Oferece apoio financeiro e técnico a essas organizações, para viabilizar projetos de defesa e promoção de direitos humanos. São iniciativas que empoderam pessoas e fortalecem a sociedade civil.
A fundação atua para que integrantes de grupos vulneráveis e vítimas de violações possam ser protagonistas de suas próprias causas, ampliando suas vozes para defendê-las. Tem ainda o objetivo de dar visibilidade ao papel das organizações na defesa dos direitos humanos. É também dessa forma que contribui para transformar realidades de violação e para o fortalecimento da democracia.
Nas visitas de monitoramento a organizações apoiadas, o Fundo Brasil oferece assistência técnica e estratégica. As visitas são também uma oportunidade de ver de perto a realidade local e fazer uma rápida avaliação do trabalho em conjunto com aqueles que o estão executando.
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