Causas e lutas indígenas: conheça e apoie
Apesar de habitarem nosso continente e o território brasileiro há milhares de anos, os povos indígenas lutam, ainda hoje, pela conquista de direitos básicos para viver. Muitas dessas lutas indígenas são resultados de preconceito por parte do restante da sociedade e de negligência do Estado.
Você poderá conhecer mais sobre essa luta ao continuar essa leitura.
Desrespeito às terras indígenas
Depois de séculos de exploração e invasões às terras indígenas, a Constituição de 1988 estabeleceu algumas normas em favor do direito desses povos. Isso por meio do processo de demarcação, que organiza os limites das terras, a fim de garantir a sua sobrevivência.
A Constituição determina, entre outras coisas, a partir do Artigo 231:
- É reconhecido aos povos indígenas direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, sendo de responsabilidade da União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens;
- As terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas destinam-se a sua posse permanente, sendo exclusivo a eles o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes;
- O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional.
Mesmo sendo determinações básicas amparadas pela Constituição, há uma constante violação em relação a elas. Isso porque muitas das demarcações previstas ainda não aconteceram em sua totalidade.
Por que demarcar as terras indígenas?
Segundo a Funai, órgão indigenista oficial do Brasil, a demarcação também contribui para diminuir os conflitos pela posse de terras. Além disso,possibilita que estados e municípios consigam atender às necessidades dos povos indígenas por meio de políticas específicas. Com isso, proporciona maior controle estatal nas áreas vulneráveis e de difícil acesso.
O Imazon divulgou em 19 de abril: área desmatada na Amazônia em março/21 triplicou em relação a março/20. O acumulado de janeiro a março em 2021 também apresenta recorde de desmatamento: o total devastado é o maior da série de 10 anos, mais do que o dobro do registrado em 2020.
Sabe onde praticamente não teve devastação da Amazônia, né? Em áreas indígenas. Elas foram responsáveis por apenas 1% do total de desmatamento. A lista é assim: áreas privadas ou sob diversos estágios de posse (66%), assentamentos (22%) e unidades de conservação (11%).
Além disso, há na demarcação das terras um impacto ambiental. Segundo estudo elaborado pela Rights and Resources Initiative, juntamente a Woods Hole Research Center e o World Resources Institute, as terras indígenas contribuem para a diminuição do efeito estufa, já que sua preservação reduz o desmatamento. O que impacta positivamente o meio ambiente. As terras indígenas brasileiras possuem o potencial de evitar a emissão de aproximadamente 31,8 milhões de toneladas anuais de dióxido de carbono à atmosfera.
Violações do Estado à terras indígenas
Mesmo que, diante da Lei, o Estado seja o principal responsável pela garantia dos direitos dos povos indígenas, o que se vê na prática segue o ritmo contrário. O papel dos órgãos públicos na violação do direito à terra é negligenciado. Apenas para dar um exemplo, dados atuais do Instituto Socioambiental – ISA – mostram que entre 2018 e 2020 o desmatamento, decorrente do garimpo, na TI Kayapó, atingiu 4,7 mil hectares e superou em 31% o total desmatado em quase 40 anos – entre 1980 e 2017.
São dados alarmantes que refletem a falta de fiscalização que é responsabilidade da União, conforme a Constituição.
Recentemente, em dezembro de 2020, foi apresentado para votação no Senado Federal, o Projeto de Lei (PL) 2.963/2019, que coloca à disposição de estrangeiros uma área equivalente a duas vezes a região Sudeste do Brasil, ou 2,12 milhões de quilômetros quadrados. É uma proposta que afeta os povos indígenas, comunidades quilombolas, assentamentos e ribeirinhos que usufruem das terras para a agricultura e moradia.
Ainda em 2020, um ministro do STF usou a atenção pública e da mídia voltada à Covid-19, para colocar em pauta mudanças nas regras ligadas à proteção ambiental e à área de agricultura e evitar críticas e processos na Justiça. O ministro admitiu que mudanças no Ministério do Meio Ambiente são mais questionadas. Para ele, a atenção da imprensa na pandemia, traria um “alívio” para passar reformas infralegais de desregulamentação.
Invasões e exploração das terras
Como consequência da falta de fiscalização, há graves fatores que colocam em risco não apenas os direitos, mas as vidas indígenas. Isso porque grileiros e garimpeiros travam uma guerra sangrenta a fim de explorar e invadir terras que não lhes pertencem.
No primeiro bimestre de 2021 foram detectados 287 hectares de garimpo nas Terras Indígenas e Unidades de Conservação do Xingu, colocando em risco a saúde dos povos indígenas e populações tradicionais, segundo dados do ISA.
O garimpo ilegal cresceu 30% na Terra Indígena Yanomami apenas no ano passado, destruindo o equivalente a 500 campos de futebol. É o que diz o relatório “Cicatrizes na floresta”, publicado pelas organizações indígenas HAY (Hutukara Associação Yanomami) e Seduume (Associação Wanasseduume Ye’kwana) com assessoria técnica do ISA (Instituto Socioambiental).
Ainda segundo o ISA, quase 40% dos Yanomami que vivem próximo a zonas de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami (TIY) podem ser contaminados pela Covid-19. Isso porque há cerca de 20 mil garimpeiros ilegalmente em sua área.
E, recentemente, o que era temido no começo de 2021 veio à tona, no mês de maio: um confronto entre os Yanomami e garimpeiros ilegais resultou em três mortes e seis pessoas feridas.
Violação de direitos básicos
A violação dos direitos básicos dos povos indígenas ocorre em vários aspectos. Podemos destacar: violência contra a mulher, falta de saneamento básico, proteção do Estado, violência policial, entre outros.
Todos esses destaques citados acima foram recentemente denunciados formalmente pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
A denúncia destaca:
- Desestruturação do sistema de proteção aos direitos dos povos indígenas;
- Programa Mais Médicos limitado justamente em tempos de pandemia, deixando milhares de indígenas sem proteção e atendimento;
- Descumprimento forçado das regras de isolamento social, já que muitos indígenas precisam se locomover em busca de alimento e atendimento hospitalar;
- Saneamento básico precário nas terras indígenas;
- Aumento da violência policial e contra mulheres indígenas;
- Aumento de invasores nos territórios indígenas.
O CIMI destacou que todas essas violações aumentaram no cenário de pandemia, onde a vulnerabilidade dos povos indígenas só cresceu.
Já há mais de 1 mil óbitos, em 163 povos. Os dados oficiais do governo apontam pouco mais de 200 óbitos, devido à subnotificação e por não considerarem a existência de indígenas residentes em centros urbanos. Estes são sepultados sem nome e sem povo.
Preconceito e racismo
Não é novidade que os povos indígenas são alvo de preconceito e racismo. São um grupo étnico que sofre com um massacre genocida há mais de 500 anos. Desde a busca pelo protagonismo de suas próprias histórias, a serem impedidos de consumir produtos básicos em supermercados.
Como aconteceu com um grupo de indígenas no Paraná, onde fiscais da prefeitura do município de Diamante D’oeste orientaram estabelecimentos a “não atenderem indígenas”, segundo matéria original do Brasil de Fato.
A desinformação, a distorção de fatos e os mitos sociais em torno dos povos indígenas são os principais causadores do preconceito.
O imaginário popular sobre os povos indígenas tende a focar em uma figura quase mítica, inferior em seus costumes, crenças, vestimentas e intelectualidade. Reduzindo uma cultura milenar, que passou por mudanças, sejam espontâneas, sejam forçadas, a algo apenas folclórico.
São mais de 500 anos de mentiras e ocultação de fatos sobre a história e lutas dos povos indígenas. São dezenas de gerações assimilando informações equivocadas sobre o “descobrimento do Brasil”, a colonização e o relacionamento de troca entre portugueses e povos indígenas.
O que, na verdade, trata-se de uma invasão, trabalho escravo, violência, genocídio, massacres e roubos.
Representatividade e voz
Na busca pela luta e conquista de direitos, os povos indígenas reivindicam a representatividade como um meio de exercerem seu papel enquanto cidadãos brasileiros. Hoje, há grupos que defendem e buscam inserir indivíduos em diversas esferas sociais e políticas, a fim de ampliarem a defesa de seus direitos.
No âmbito político, houve um destaque para o ano de 2020. Dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e do Instituto Socioambiental (ISA) apontam que, no primeiro turno, os indígenas obtiveram 213 cadeiras nas Câmaras Municipais, 10 prefeituras e 11 postos de vice. Segundo a Apib, as campanhas vitoriosas em 2020 representam aumento de 17% em relação aos cargos conquistados quatro anos antes.
No campo da educação, 56,7 mil indígenas estão matriculados no ensino superior do país, número que representa 0,68% do total de 8,3 milhões de estudantes matriculados nessa etapa, de acordo com o mais recente Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), de 2017.
As plataformas digitais também tornaram-se um importante instrumento para diversos indígenas, que compartilham tanto a realidade do dia a dia quanto a quebra de estereótipos sobre sua história. Alguns exemplos que você pode buscar conhecer são:
- Denilson Baniwa, publicitário, artista plástico, ilustrador, comunicador e ativista indígena do povo Baniwa,
- Cristian Wariu Tseremey’wa, indígena Xavante com ascendência Guarani e youtuber.
Para que as conquistas dos povos indígenas sejam ampliadas e efetivadas, é importante que a sociedade não indígena atue fortalecendo o conhecimento sobre a realidade dos povos indígenas, a fim de eliminar preconceitos.
Também é fundamental apoiar quem já fortalece o protagonismo dos povos indígenas na busca por seus direitos.
O Fundo Brasil faz isso. Você pode conhecer mais sobre esse trabalho contínuo e ficar por dentro dos projetos que apoiamos aqui.