Reconhecido como componente indispensável para formação dos Direitos Humanos, o direito à alimentação está expresso no artigo 6º da Constituição Federal de 1988. No Brasil, esse direito só pode ser exercido de maneira plena com apoio da agricultura familiar, modelo de produção que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), fornece 70% dos alimentos consumidos no território nacional. Dentre aqueles inseridos nesse sistema de plantio estão as comunidades Quilombolas, que fazem dele sua principal fonte de renda.
Essas comunidades desenvolveram práticas de uso comum da terra, valorizando o território como meio de subsistência, provendo recursos a partir de um modelo de desenvolvimento rural sustentável e digno, promovendo a Soberania Alimentar e também gerando renda para os pequenos produtores rurais. Tamanha é sua importância que, em 2018, o sistema de plantio da região do Vale do Ribeira, em São Paulo, foi reconhecido como Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Essa localidade conta com aproximadamente 88 comunidades remanescentes dos quilombos.
Entretanto, apesar de todos esses aspectos que garantem que as pessoas serão providas com alimentos saudáveis vindos de toda uma cadeia produtiva, a realidade não é essa. Além disso, o Brasil ainda carece de políticas públicas que olhem para os pequenos produtores. O desafiador cenário nacional é marcado pela concentração de terras nas mãos de agricultores mais capitalizados. O Censo Agropecuário de 2017 define que são 5.07.152 estabelecimentos rurais distribuídos pelo território nacional, contudo, apenas 1% deles (50.865) é responsável pela concentração de 47,5% das terras agrícolas do país.
Esse panorama somado às políticas que incentivam agricultores a aderirem à monocultura, como é feito no agronegócio; a ausência de políticas de democratização e regularização fundiária; e o não reconhecimento dos direitos de povos tradicionais são elementos que corroboram para a desigualdade agrária e que, por sua vez, têm como consequência o acirramento dos conflitos que resultam em ameaças de despejos, invasões e ações de pistolagem, no desmatamento para abertura de novos pastos para a pecuária extensiva e a monocultura, trazendo como impactos, menor biodiversidade, poluição das águas e insegurança alimentar.
A discussão sobre a necessidade de incentivo ao modelo familiar ganhou um caráter ainda maior de urgência após 2019, quando a gestão governamental da época reduziu recursos para a agricultura familiar Quilombola, contribuindo para o alastramento da fome e, consequentemente, o empobrecimento dos núcleos familiares dessas comunidades. Portanto, é preciso enxergar a agricultura familiar como garantidora de uma alimentação de qualidade,como uma alternativa à fome e de combate à pobreza
Em parceria com o Fundo Brasil, a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) lançou o edital Fortalecendo Saberes e Fazeres da Agricultura Quilombola, com o intuito de apoiar até 28 comunidades e organizações com valores de até R$ 30.000,00 por projeto. As inscrições devem ser feitas até às 18h00 do dia de setembro no portal Prosas.
Fundo Brasil e CONAQ
O Fundo Brasil de Direitos Humanos, em parceria com a Fundação Ford, apoia a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) para fortalecer a agenda política e a resiliência das organizações e comunidades quilombolas de todo o Brasil.
Trata-se de uma iniciativa de transferência de conhecimento para a CONAQ, focada em impulsionar a capacidade de gestão e de apoio a projetos e a sustentabilidade desta que é a maior organização quilombola do país. Pretende-se que a CONAQ se aproprie dos conhecimentos e desenvolva outros para construir de forma autônoma suas estratégias e metodologias para apoiar a luta dos quilombos por direitos, terra, renda, soberania e segurança alimentar, e o desenvolvimento e sustentabilidade de suas organizações em todo o país.