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Segundo o último Censo, realizado pelo IBGE em 2022, o Brasil é habitado por cerca de 1,7 milhão de indígenas, distribuídos por 4.832 municípios. Um número assemelhado à população de grandes capitais ao redor do mundo. E, ainda assim, representando boa parcela dos cidadãos brasileiros, os povos indígenas enfrentam lutas antigas, que têm sua origem na colonização do país.
Ao contrário do imaginário popular e do que os livros didáticos contavam, não houve uma descoberta do Brasil por meio dos portugueses. Segundo dados da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), antes da invasão dos europeus, o território Pindorama era a moradia de cerca de 3,5 milhões de habitantes nativos, inicialmente chamados de “índios”, em referência às Índias, local ao qual os portugueses alegaram terem chegado.
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Ao longo do tempo, essa conotação negativa contribuiu para a marginalização e desrespeitou a própria identidade cultural indígena, homogeneizando e ignorando as especificidades de cada povo que habitava esse território.
É muito comum que se resuma a história dos povos indígenas brasileiros a partir da colonização portuguesa. De fato, esse acontecimento é um marco na trajetória dos povos indígenas, pois a partir disso, inicia a luta pelas terras, por sobrevivência e por direitos básicos que perdura até hoje, somando 524 anos de resistência.
No entanto, conhecer as origens dos povos indígenas é igualmente importante, para garantir o respeito, a defesa e o reconhecimento da cidadania de um povo que, sem aviso, perdeu terras, alimentos, liberdade e vidas.
Nesse artigo, você poderá conhecer a história e cultura e as lutas dos povos indígenas. Acompanhe:
História dos Povos Indígenas
Sobre a origem dos indígenas brasileiros, existem duas hipóteses aceitas, segundo o Instituto Socioambiental (ISA). A primeira é de que os indígenas descendem dos povos asiáticos que atravessaram o estreito de Bering há 62 mil anos.
A segunda, defende uma única grande onda migratória no começo, com a vinda posterior de grupos aparentados aos povos da Oceania. Os levantamentos estão na “Science” e na “Nature”, as duas maiores revistas científicas do mundo, e ambas têm participação de brasileiros. Estudos arqueológicos recentes estabelecem a chegada dos primeiros habitantes do Brasil à Bahia e ao Piauí, entre 20 e 40 mil anos atrás.
Estabelecidos nas terras que ofereciam fertilidade, os nativos passaram a viver em regime de comunidade, onde prevalecia a produção comunitária. Sendo que os trabalhos eram divididos de acordo com sexo e idade. Eles eram produtores de milho, feijão, mandioca, cará, batata-doce, abóbora e tabaco. Além disso, parte da alimentação vinha da pesca.
Entre os grupos indígenas havia muitas formas de conceber e construir as casas, pois cada grupo tinha um jeito diferente de pensar e de se relacionar com o ambiente onde viviam. Assim, os tipos de casas eram uma das principais características dos povos indígenas.
Ainda segundo o Instituto Socioambiental (ISA), a maneira como a casa era utilizada, dividida e construída refletia o jeito que os moradores tinham de organizar e se enxergar no mundo. Além disso, as construções variavam conforme o modo de vida, o clima, o tipo de ambiente e os materiais de que os grupos dispunham para a construção.
As formas das casas poderiam ser circulares, retangulares, pentagonais, ovais. Feitas de matérias-primas diferentes: madeira com teto de palha, inteiras em palha ou folhas. Todas essas práticas perduraram por anos, geração após geração, sem sofrer influências externas.
Os diferentes povos tinham liberdade de seguir seus próprios costumes, a começar pela língua. Existiam vários troncos linguísticos, como o Tupi ou Macro-Tupi, Macro-Jê e Aruak.
Invasão portuguesa
Em 1500, os portugueses desembarcaram no “Novo Mundo”, a América, tomando posse das terras. Em seguida, tiveram os primeiros contatos com os nativos, designados pelos portugueses de “selvagens” e, posteriormente, indígenas. Havia cerca de 3,5 milhões de nativos, divididos em 1.400 povos diferentes.
Alguns historiadores chamaram o primeiro contato entre portugueses e os povos indígenas de “encontro de culturas”, como uma tentativa — equivocada — de amenizar as péssimas relações mantidas, desde o começo.
Na realidade, desde o início do processo de colonização portuguesa houve “choque de culturas”, que correspondeu a um processo de extermínio e submissão dos indígenas — tanto por meio dos conflitos com os portugueses quanto pelas doenças trazidas por estes, como a gripe, a tuberculose e a sífilis.
Desde então, a história dos povos indígenas é marcada pela brutalidade, escravidão, violência, doenças e genocídio.
Extermínio dos povos indígenas
No primeiro século de contato, 90% dos indígenas foram exterminados, principalmente por meio de doenças trazidas pelos colonizadores, como a gripe, o sarampo e a varíola. Nos séculos seguintes, milhares de vítimas morreram ou foram escravizadas nas plantações de cana-de-açúcar e na extração de minérios e borracha.
Em cinco séculos, 700 das 1.200 nações indígenas foram exterminadas. Segundo pesquisas do antropólogo Darcy Ribeiro, 55 povos desapareceram somente na primeira metade do século 20.
Na década de 1950, a população caiu para um número tão baixo que foi previsto que nenhum indígena sobreviveria até o ano de 1980. Estima-se que, em média, um povo se tornou extinto a cada ano entre 1900 e 1957.
As lutas dos povos indígenas
Após tornarem-se escravos da colônia portuguesa, os povos indígenas passaram a enfrentar diversas lutas em torno da própria sobrevivência. Com o extermínio de povos indígenas e a escravidão, milhares de famílias e indivíduos afugentados se refugiaram em áreas remotas, evitando o contato com pessoas não indígenas.
Sendo assim, esses povos perderam acesso e direito às próprias terras, sem a possibilidade de cultivar alimentos ou ter acesso a rios para pescar, já que as grandes cidades iniciaram suas atividades em torno das águas.
Daí em diante, os enfrentamentos às invasões, às queimadas, os grileiros, à fome e à discriminação, tornou-se uma árdua rotina dos povos indígenas.
Crimes contra os povos indígenas
Em 1967, Jader Figueiredo, um procurador federal, publicou um relatório de 7.000 páginas que catalogou milhares de atrocidades e crimes cometidos contra os povos indígenas, incluindo assassinatos, torturas, prostituição forçada, escravidão e roubos de terra.
Em um caso notório conhecido como “o massacre do paralelo 11”, um barão da borracha ordenou que seus homens arremessassem dinamite em uma aldeia indígena do povo Cinta Larga. Aqueles que sobreviveram ao ataque foram assassinados por seringueiros que os atacaram com facões.
O relatório estampou manchetes internacionais e levou à dissolução do Serviço de Proteção ao Índio (SPI). O SPI foi então substituído pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), órgão que continua a ser o departamento de assuntos indígenas do governo.
Entre 1970 e 1980, uma nova onda de construção de hidrelétricas e estradas e o desenvolvimento de atividades de pecuária e mineração causou a morte de milhares de indígenas, além de deixar sem terra outros tantos. Dezenas de povos indígenas foram aniquilados neste período. Além disso, essa época foi marcada por movimentos indígenas para reivindicar direitos e denunciar as violências vivenciadas por esses povos.
Com a nova constituição redigida em 1988, os indígenas e seus apoiadores fizeram pressão por mais direitos. Desde então, eles têm conseguido alguns avanços, ainda que não tenham acesso pleno aos direitos territoriais que têm garantidos na Constituição e na lei internacional.
Cenário atual dos povos indígenas
Muito ainda precisa ser feito para fortalecer as lutas dos povos originários no Brasil. Os direitos dos povos indígenas ainda são desrespeitados e ignorados pelo Estado. O que abre margem para grandes indústrias hidrelétricas, de mineração e do agronegócio explorarem terras que não as pertencem, reduzindo ainda mais as possibilidades de moradia e alimentação de milhares de indígenas.
Para além dos desafios territoriais, os povos indígenas enfrentam, atualmente, problemas com racismo, preconceito, violação aos direitos das mulheres indígenas, falta de acesso à saúde e serviços públicos, além da alimentação escassa e pobre em nutrientes.
Desafios que se agravaram durante a pandemia do coronavírus. O que tirou a vida de milhares de indígenas e colocou em risco tantas outras que, em lugares remotos e sem acesso à saúde, se viram sem apoio do governo, o qual tomou medidas ineficazes nos combate à proliferação do vírus nos territórios indígenas.
Os próprios indígenas se mobilizam nas esferas política e social, em busca de amenizar um sofrimento agravado e que se estende por meio milênio, somado à crise climática e também à crise sanitária. O Fundo Brasil apoia projetos liderados pelos próprios povos indígenas em busca de garantir e defender seus direitos definidos pela Constituição.
Você pode apoiar essa causa junto com a gente!