MEC cobra explicações sobre expulsão de aluna
Ministra de Políticas para Mulheres, professores e UNE atacam decisão, mas Uniban afirma que ato ‘é irrevogável’
Martha Beck, Soraya Aggege e João Sorima Neto
BRASÍLIA e SÃO PAULO
Jornal O Globo – 09/11/2009
O Ministério da Educação e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres vão cobrar explicações da Universidade Bandeirante (Uniban), de São Bernardo do Campo (SP), sobre a decisão de expulsar a aluna Geisy Arruda. Ela foi hostilizada por centenas de colegas por usar, em aula, um vestido visto por eles como muito curto. O incidente, em 22 de outubro, em que a jovem teve de ser resgatada por policiais para fora do campus, foi parar na internet.
Segundo a secretária de Educação Superior do MEC, Maria Paula Dallari, o que mais chama a atenção é a desproporção entre as punições aplicadas nos envolvidos na confusão. Geisy foi expulsa, e alguns dos colegas que a ofenderam só foram suspensos.
Para Dallari, pode ter havido tratamento diferenciado por uma questão de gênero. A ministra Nilcéa Freire, da Secretaria de Mulheres, disse à Agência Brasil que a atitude da Uniban demonstra “absoluta intolerância e discriminação”: — É absurdo. A estudante passou de vítima a ré. Se a universidade quer ter padrões de vestimenta adequados, deve avisar aos alunos claramente que padrões são esses.
Após analisar o caso, a Secretaria de Ensino Superior (Sesu) do MEC poderá publicar recomendação para que a Uniban exerça melhor seu papel como instituição educadora. A Sesu deve trabalhar em parceria com o Ministério Público, dando parecer sobre o caso. — Existir conflito não é o problema. A questão é como uma instituição, que tem como dever educar e formar alunos para a cidadania, reage — afirmou Maria Paula Dallari. Ela disse ainda que vai pedir cópia do processo de investigação aberto pela própria universidade.
Segundo advogados da Uniban, além de usar o vestido curto, Geisy teria se comportado de forma imprópria: — Este assunto merece ser completamente explicado.
A União Nacional dos Estudantes (UNE) iniciou campanha em defesa da jovem. Além de emitir manifesto, fará hoje manifestação de repúdio. O presidente da UNE, Augusto Chagas, considerou descabida a expulsão: — É como nos casos em que se responsabiliza a vítima de um assalto por estar segurando a carteira, ou se diz que uma mulher é culpada, num assédio, por causa da roupa.
Para a coordenadora do curso de Pedagogia da Unicamp, Maria Márcia Malavazi, o caso contraria os preceitos da boa educação escolar. — Educação também é ensinar o papel das pessoas no mundo. A atitude dessa universidade é de falsa moral, um machismo desprezível — disse.
Segundo Sérgio Haddad, dirigente das ONGs Ação Educativa e Fundo Brasil de Direitos Humanos, a obrigação da universidade é, no mínimo, discutir a tolerância diante das diferenças: — Além disso, é alimentar um machismo deplorável. Infelizmente, é comum no Brasil a desigualdade de gênero. Mas, numa universidade?
O advogado de Geisy, Nehemias de Melo, disse que deve entrar na Justiça contra a expulsão.
Geisy foi procurada pelo GLOBO, mas preferiu não se manifestar. Já o advogado da Uniban, Décio Machado, afirmou que a expulsão é irrevogável. Segundo ele, a reitoria da Uniban decidiu desligar a jovem por concluir que sua postura “afrontou os princípios de dignidade e moral previstos no regimento da instituição.”
El Pais
A reportagem foi publicada ainda no jornal El Pais, da Espanha. Confira aqui
Repercussão
No dia 10, o MEC arquivou o pedido de explicações, após a desistência da universidade de expulsar a estudante. Segundo informações da Agência Brasil, a Secretaria de Educação Superior do Ministério deve acompanhar com atenção o processo de reinserção da aluna na instituição.