Mulheres brasileiras de várias gerações, todas com relevante atuação na luta por direitos e pela democracia, se encontraram no 8 de março para celebrar o Dia internacional da Mulher em uma roda de conversa sobre conquistas e perspectivas de lutas.
O encontro ocorreu na Casa 95, com apoio do Fundo Brasil na organização. O Brunch 8 de Março: Mulheres em Todos os Tempos recebeu mais de 70 pessoas – mais de 60 delas, mulheres – entre interessadas em acompanhar a conversa e ativistas com atuações relevantes desde a década de 1970.
As pessoas presentes puderam ouvir as reflexões de feministas históricas como Iara Prado, Ieda Areias e Maria Malta, além de dialogar com Beth Belo e Leda Kfouri. O Fundo Brasil convidou especialmente para o brunch mulheres que integram grupos apoiados: Amelinha Teles, uma das principais feministas da América Latina, fundadora, há 38 anos, da União de Mulheres de São Paulo; Carla Aguilar, que atua no Centro de Apoio e Pastoral do Migrante (Cami); Regiany Silva, do coletivo de jornalistas Nós, Mulheres da Periferia; e Renata Prado, da Frente Nacional de Mulheres do Funk.
A superintendente adjunta do Fundo Brasil, Gislene Aniceto, deu as boas vindas às mulheres. Pelo Fundo Brasil compareceu ainda a integrante do Conselho de Administração Mafoane Odara, que lembrou os 25 anos da histórica Conferência de Pequim, organizada pela ONU em 1995. Foi a maior assembleia de defensoras da igualdade de gênero de todos os tempos. Resultou em um documento com estratégias de atuação em 12 áreas fundamentais – pobreza, formação, saúde, violência, conflitos armados, economia, poder, mecanismos institucionais, direitos humanos, comunicação, ambiente e meninas – adotado por 189 governos.
“Nosso papel é renovar o compromisso de luta pelos direitos das mulheres da nossa e das próximas gerações”, refletiu Mafoane.
A também conselheira do Fundo Brasil Kenarik Boujikian falou sobre a relevância de causas que defendem as mulheres brasileiras mais discriminadas, como as mulheres encarceradas. “Foram essas as causas que sempre defendi”, pontuou.
Desafios. As presentes compartilharam suas inquietações sobre o atual momento do país, no qual conquistas das mulheres vêm sendo relativizadas e atacadas por grupos conservadores que pretendem reduzir direitos. “Há uma raiva contra mulheres”, disse Amelinha Teles. “Ódio, o que existe hoje é um ódio contra nós”, responderam várias das participantes.
Ana Wilheim e Maria Malta lembraram a histórica luta por creches na década de 1980. “Parece que a creche é para liberar a mulher para o trabalho, mas não. É para liberar a mulher para a vida, para a participação política”, disse Maria Malta. Também se conversou sobre o papel das mulheres no combate à ditadura militar no Brasil.
Apesar da gravidade dos temas em debate, as mulheres presentes reafirmaram a disposição para a luta. “Eu continuo”, disse Amelinha Teles. “Sempre fui e sempre serei militante, defensora das mulheres”, disse. Amelinha também lembrou a iniciativa de criar no Brasil os grupos de Promotoras Legais Populares, uma ideia que começou no Chile.
As chamadas PLPs são lideranças comunitárias que orientam mulheres no acesso à justiça e aos serviços de apoio contra violações de direitos.
Juventude. Iara Prado fez uma crítica contundente à escalada do autoritarismo que se observa em setores da política e da sociedade brasileiras. E questionou as presentes sobre como se dá, no contexto atual, a luta da juventude por democracia.
“Os jovens estão mobilizados. Lutaram contra o fechamento das escolas, no movimento dos secundaristas. Mobilizam-se contra a retirada de direitos, contra a precarização de suas vidas. E muitas vezes esses jovens não sabem o que fazer, não sabem como lutar. Precisam ser vistos e precisam de apoio”, disse Renata Prado, da Frente Nacional de Mulheres do Funk.
Mafoane Odara, do Fundo Brasil, lembrou que cada uma das presentes pode ajudar nas lutas dos jovens e das gerações mais velhas a partir do seu papel na sociedade. “Nem sempre é o caso de todas aqui irem à periferia, porque nem todo mundo tem lugar de fala. Algumas vão, dialogam, ajudam. Outras ajudam com doações. Assim, todas nós fazemos o nosso papel nas lutas”, concluiu.
Veja mais fotos do Brunch 8 de Março: Mulheres em Todos os Tempos.
Sobre a Casa95
É um espaço gastronômico que serve almoços, jantares, brunchs e realiza eventos especiais. Também é a residência da socióloga Ana Wilheim e do geógrafo Og Dória, que solidariamente apoiam o Fundo Brasil e sugerem uma doação dos/as participantes para a promoção dos direitos das mulheres. Na Casa 95, o casal transformou a arte de receber bem em casa em um pequeno negócio. Ela recebe, ele cozinha.
Em 2019, a Casa 95 iniciou o projeto de brunchs temáticos, com o objetivo de promover boas conversas sobre temas como infância, cultura, direitos humanos, artes e música.
Sobre o Fundo Brasil
É uma fundação independente, sem fins lucrativos e sem financiamento familiar ou empresarial, criada por ativistas dos direitos humanos. Em 14 anos de atuação, o Fundo Brasil acumulou conhecimento apurado sobre as demandas de todas as regiões brasileiras e as organizações locais que trabalham para ampliar as vozes dos sujeitos destes territórios, contribuindo para que sejam protagonistas de suas lutas. Desta forma, a fundação atua como uma ponte, ligando doadores a projetos que promovem os direitos básicos da cidadania em todo o país.
Os editais do Fundo Brasil são processos públicos isentos e transparentes, por meio dos quais são selecionados projetos que defendem direitos de pessoas negras, indígenas, de populações tradicionais, quilombolas, mulheres, jovens, vítimas da violência de Estado e seus familiares, da população encarcerada, de comunidades impactadas por grandes obras de infraestrutura ou megaempreendimentos urbanos, entre outros.