O lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em 2007, a realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olímpiadas de 2016 multiplicaram os investimentos públicos e privados na economia brasileira, sobretudo em infraestrutura. Segundo informações do Ministério da Fazenda, das 50 grandes obras de infraestrutura e energia do mundo 14 são nacionais.
“A necessidade de renovação e expansão da infraestrutura do país, como indicam os recentes problemas em portos, aeroportos e no transporte urbano, não pode ser feita sem consolidar o respeito aos direitos das populações”, explicou Ana Valéria Araújo, coordenadora executiva do Fundo Brasil, na abertura da mesa “Grandes Obras e Empreendimentos: devida diligência para o respeito aos direitos humanos, mitigação e remediação de impactos”, durante o último 4 de setembro, na Conferência Ethos 2013.
Parte do módulo “Diretos Humanos – O respeito aos direitos humanos e seu valor para os negócios”, que conta com a parceria da Petrobras, o painel problematizou a ocorrência de violações aos direitos humanos sobre populações, culturas e atividades na construção de grandes obras. Para Nelson Saule, diretor do Instituto Pólis, a promoção de direitos humanos não pode ser incompatível com desenvolvimento econômico. Saule ainda afirmou que se planejam as obras, mas não se levam em conta os impactos.
Já Luiz Dalla Costa, coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), comentou sobre a influência dos violadores de direito perante o Estado para que não haja mecanismos de proteção. Para ele, isso indica a necessidade de apuração das responsabilidades dos empreendedores, públicos e privados, que não se preocupam em dar as salvaguardas necessárias para a relação harmoniosa com as populações afetadas.
O Movimento dos Atingidos por Barragens surgiu como reação à construção de grandes hidrelétricas sem o devido respeito aos direitos dos moradores das regiões atingidas. Segundo Dalla Costa, a instituição entregou um relatório para o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, órgão do Governo Federal, relatando as violações ocorridas nessas obras. De acordo com o documento, foram constatados mais de 16 tipos de violação, que incluem o desrespeito às práticas e modos de vida tradicional, educação, saúde e informação.
Ana Maria Drummond, diretora executiva da Childhood Brasil, abordou a experiência da organização na busca de soluções para o problema da exploração sexual de crianças e adolescentes. O segmento é um dos mais afetados com a construção de grandes obras devido ao alto deslocamento de homens para as frentes de trabalho, elevando drasticamente os casos de prostituição e exploração sexual de crianças e adolescentes. Ela salientou ser importante capacitar os empregados para entender temas de direitos humanos, além de realizar um diálogo permanente entre os setores: governos, empresas e sociedade civil para o enfrentamento às violências, criando condicionantes e prevenindo o problema.
Quanto às indenizações e a mitigação de impactos, é importante considerar as necessidades de cada comunidade. Julia Mello Neiva, representante e pesquisadora do Business & Human Rights Resource Centre para o Brasil, Portugal e países africanos de língua portuguesa, falou da existência de uma série de instrumentos em nível nacional e internacional, e enfatizou a necessidade de luta por um sistema de justiça que funcione, tanto para atuar no local da violação, quanto para punir as empresas.
Para Ana Valéria, os problemas descritos na mesa só serão resolvidos quando o Estado brasileiro incorporar a necessidade de considerar obrigatoriamente as opiniões das populações afetadas pelas grandes obras. Segundo ela, infelizmente, o Estado usa os mecanismos de consulta existentes na legislação como rito meramente formal destinado a consolidar a vontade dos governantes ao invés de ser o caminho para aprovar, na prática, as expectativas das comunidades.
A Conferência Ethos 2013 – Negócios Sustentáveis e Responsáveis: oportunidades para as empresas e para o Brasil – aconteceu de 3 a 5 de setembro, em São Paulo. Outras informações: http://www3.ethos.org.br/ce2013/
Luta pelos direitos
O Fundo Brasil vem apoiando, por meio de seus editais anuais, diversas iniciativas que buscam soluções para os impactos causados por grandes obras de infraestrutura e para os megaeventos esportivos.
Atualmente, 12 projetos relacionados à Copa do Mundo estão em andamento por meio do Edital Específico, realizado em 2012, e três iniciativas estão contempladas no Edital Anual 2013: Direito à resistência: A luta da comunidade Poço da Draga pelo direito à moradia e contra a violência institucional; Defesa dos direitos dos povos do rio Xingu, violentados pela construção das barragens de Belo Monte; e Comunidade tradicionais dos Areais da Ribanceira – Luta pelo reconhecimento, acesso a justiça e construção de direitos.