Em 11 de maio de 1988, Edmeire Exaltação se juntara a mais de 5 mil pessoas, que caminhavam rumo ao Monumento de Zumbi dos Palmares, na cidade do Rio de Janeiro.
A Marcha do Movimento Negro contra a Farsa da Abolição ficou conhecida como uma das maiores demonstrações públicas do Movimento Negro contemporâneo. Os manifestantes protestavam contra as comemorações do centenário da abolição da escravidão naquele ano.
Militantes saíram da Candelária até o monumento, na Praça Onze. Mas não conseguiram seguir o trajeto da manifestação pré-agendada e autorizada. Foram impedidos por mais de 600 soldados fortemente armados.
Este acontecimento é apenas um dos muitos que vêm à memória de Edmeire ao recordar a longa trajetória percorrida pelo Movimento Negro até os dias atuais na luta por direitos para a população preta.
“Recordo perfeitamente daquele grande dia. Foi um marco de luta, de resistência. A gente relembra desses passos hoje para nos fortalecer e continuar. A marcha e as nossas lutas continuam avançando”, disse Edmeire Exaltação, co-fundadora e coordenadora geral das Casa das Pretas.
Em evento promovido pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos, na capital paulista, entre os dias 10 e 11 de agosto, Edmeire e representantes de outros coletivos apoiados pelo edital Enfrentando o Racismo a Partir da Base 2022, participaram do encontro de formação e fortalecimento institucional.
Em uma das dinâmicas, ativistas e militantes mais velhos e mais novos relembraram a caminhada do Movimento Negro até os dias atuais, para tomar fôlego e avançar na conquista por direitos.
Fortalecer as organizações da sociedade civil por meio de atividades de formação e treinamento faz parte da missão estratégica do Fundo Brasil.
“A gente proporciona esses momentos de articulação, porque faz parte do que o Fundo Brasil acredita. Então, além do apoio com as doações, a gente sabe que esses momentos aqui potencializam o trabalho sobre os desafios que precisamos enfrentar em conjunto”, disse Allyne Andrade, superintendente adjunta do Fundo Brasil.
Durante os dois dias, as organizações presentes participaram de atividades para análise de conjuntura, além da troca de experiência e impressões, para definir prioridades de ação em seus territórios e para o avanço de conquistas de direitos.
Linha do tempo do Movimento Negro
Bianca Santana, jornalista, escritora, professora e militante feminista conduziu as discussões no primeiro dia e convidou os participantes da luta antirracista presentes a buscarem, em suas memórias e vivências, os passos dados pelas mulheres negras e pelos homens negros, ao longo da história no Brasil, para progressos fundamentais concretos e visíveis atualmente.
Divididos em grupos, misturados por estados, sotaques e com diferentes experiências e recordações, os participantes puxaram na memória datas e detalhes de lutas e das conquistas do povo preto no Brasil.
Em poucos minutos, o resultado foi a produção de uma linha do tempo detalhada, com datas, locais e inúmeros fatos marcantes, num processo de valorização da história que permite aos militantes negros exaltar as experiências históricas de resistência e o protagonismo social, garantindo a essa população o direito à memória.
“Incrível essa atividade! A gente teve poucas oportunidades de olhar para dentro. Acho que é um trabalho que me faz perceber o quanto que a gente já andou, o quanto já conquistou o quanto ainda temos que conquistar. Passou um filme na minha cabeça de tudo o que a gente viveu e de tudo que a gente já conquistou”, comemorou Edmeire.
Fatos como a criação de datas marcantes no calendário nacional, de direitos constitucionais, da fundação de instituições da luta antirracista, assim como a criminalização do racismo, entre outros foram citados.
“Às vezes a gente se apavora, por achar que as coisas não vão para frente. Mas hoje, percebemos o quanto temos avançados na nossa caminhada. É muito bom isso que o Fundo Brasil faz com a sua rede de apoiadores, porque isso faz uma diferença tremenda quando a gente volta para os nossos espaços”, agradeceu Luciana de Freitas, do Quilombo de Aldeia, em Garopaba, Santa Catarina, do Movimento Negro Unificado do Estado. “É de uma riqueza tremenda conhecer o trabalho de outros locais. Com essa troca, a gente aprende e se fortalece muito. Então é um trabalho essencial”.
Enfrentando o Racismo a partir da Base
O edital Enfrentando o Racismo a partir da Base está em sua terceira edição. Desta vez, 24 grupos selecionados, de 15 estados brasileiros, receberam até R$ 50 mil cada.
Os recursos de natureza flexível, podem ser usados da forma como o grupo proponente considerar adequado para garantir a sustentabilidade de suas atividades de promoção e defesa de direitos humanos dentro da pauta do enfrentamento ao racismo.
O edital é realizado com apoio da Warner/Blavatinik Social Justice Fund. Para conhecer os projetos apoiados pelo Fundo Brasil no enfrentamento ao racismo, clique aqui.
Além do edital específico, as organizações, grupos e coletivos da luta antirracista são apoiados pelo Fundo Brasil no âmbito de outros editais.
“Foi a primeira vez que eu vim em uma atividade do Fundo Brasil presencial e, estar aqui, representa um respiro de esperança, por ver que, por mais que as coisas pareçam difíceis, nós estamos em movimento e avançando. De ver que existe um corpo muito maior e que não somos poucos e temos apoiadores, como o Fundo Brasil, do nosso lado”, Rosselini Muniz, do Coletivo Iyakobiode, de Brasília.