Perto dos 80 anos, o agricultor Chico Paiva é figura respeitada no vilarejo Riacho das Pedras, em Santa Quitéria, Ceará. Cheio de histórias para contar, ele conhece como ninguém a terra e a defesa dos territórios camponeses. Chico é o personagem principal de uma história em quadrinhos criada pela Articulação Antinuclear como parte da “Campanha Antimineração no Ceará: em defesa dos territórios camponeses”, apoiada pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos.
Na história, Chico tem um pesadelo: vê o vilarejo pacato transformado em complexo industrial para mineração e beneficiamento de fosfato e urânio, minerais encontrados na jazida de Itataia, a 30 km de Riacho das Pedras.
No pesadelo, a mineração transforma completamente o cenário ocupado por agricultores tradicionais. Centenas de pessoas chegam à localidade e mudam o cotidiano, pequenas explosões arrancam pedaços da serra frequentada por Chico na infância, uma nuvem de poeira e fragmentos de rocha ocupa o ar, máquinas pesadas andam de um lado para o outro, homens mascarados, vestidos dos pés à cabeça com roupas brancas e galochas pretas circulam apressados, o medo da contaminação por radiação é constante.
O velho agricultor é acordado pelo neto e os dois conversam sobre o que pode acontecer ao vilarejo no futuro, com a exploração dos minérios. No vilarejo, a jazida é chamada de dragão. Para muitos moradores, o certo é não acordar o dragão adormecido.
“Nós não vamo deixa isso acontecer aqui. Escute o que eu tô te dizendo, vô”, diz o jovem. “Vamos mesmo não, filho. O povo unido pode muito. Se a gente se organizar, a gente não deixa isso acontecer”, responde o avô.
A história em quadrinhos traduz e divulga informações sobre os riscos e os danos da exploração de urânio e fosfato no Ceará, um dos objetivos da campanha da Articulação Antinuclear. O outro objetivo do projeto apoiado pelo Fundo Brasil foi acompanhar juridicamente o licenciamento ambiental do Projeto Santa Quitéria. O grupo foi apoiado por meio do edital anual 2015.
Para a produção do material, o grupo realizou uma oficina de roteirização de quadrinhos com jovens de Santa Quitéria. A Articulação Antinuclear convidou o professor Pedro José Arruda Brandão, da Oficina de Quadrinhos da Universidade Federal do Ceará, para essa atividade.
Os jovens foram mobilizados por meio das redes sociais. Eles entrevistaram moradores sobre os impactos observados na região desde que o governo identificou a jazida mineral de Itataia, na década de 1970.
Chico Paiva foi um dos entrevistados e por isso inspirou os criadores da HQ, chamada “Ceará antinuclear em defesa da vida, da água e por justiça ambiental”, com 20 páginas. A publicação foi distribuída para jovens das comunidades impactadas.
Articulação
A Articulação Antinuclear do Ceará é uma organização da sociedade civil que tem a missão de contribuir para o protagonismo das comunidades rurais afetadas pelo Projeto Santa Quitéria, que pretende minerar urânio e fosfato na jazida Itataia.
Além das comunidades do sertão central do Ceará, é formada pelo Núcleo Tramas – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde da Universidade Federal do Ceará; Cáritas Diocesana de Sobral; Comissão Pastoral da Terra; Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra; e Coletivo Urucum – Direitos Humanos, Comunicação e Justiça.
A Articulação Antinuclear cria e socializa novas estratégias de defesa dos territórios rurais por meio da promoção de espaços de encontro entre as comunidades impactadas, da formação em direitos humanos, de formas de resistência e difusão de informações.
A organização foi selecionada para receber apoio também por meio do edital anual 2016, em projeto que pretende visibilizar e incidir, através de uma campanha advocacy, sobre os impactos socioambientais que a mina de Santa Quitéria trará para a região e garantir que a população possa preservar seus modos de vida e trabalho tradicionais.
Leia aqui a história em quadrinhos.