Nos próximos dias 3 e 4 de março, o Instituto Humanitas, apoiado pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos, e a Defensoria Pública do Estado do Pará iniciam o processo de reconhecimento étnico de aproximadamente 600 indígenas ribeirinhos e da cidade de Altamira (PA). Esse é um dos principais objetivos do projeto Irema (Identidade e Reconhecimento Étnico na Microrregião de Altamira).
Antônio Carlos Magalhães, coordenador de projetos do Instituto Humanitas, explica que a situação dos índios é muito variada. Alguns precisam da declaração de reconhecimento, outros não possuem sequer certidão de nascimento. Há ainda aqueles que precisam corrigir o sobrenome indígena que não foi gravado segundo a convenção nacional. É o caso da etnia Xipaia, escrita erroneamente como “Chipaia”.
Uma equipe de 40 pessoas participa da ação. Entre elas, estão voluntários do Centro de Defesa dos Direitos Indígenas (instituição coordenada pelos próprios índios), membros do Instituto Humanitas e da Defensoria Pública.
A Defensoria Pública cuidará dos registros de nascimentos tardios junto à autoridade cartorária competente. Ela ainda será responsável pelos processos judiciais que requerem o acréscimo do nome da etnia ou a sua correção no registro civil. A coleta dos dados e as peças judiciais serão feitas nesses dois dias pelo órgão. De acordo com Fábio Rangel Pereira de Souza, defensor público agrário, está previsto para que os resultados dessas análises sejam apresentados no final do mês de março, quando será organizado um segundo mutirão.
A ação é fruto de um longo processo de negociação e reivindicação do reconhecimento dessas etnias, que começou em 2007, quando o projeto Irema ainda estava na sua primeira fase. Naquela época, foi realizado um diagnóstico antropológico e socioeconômico da população indigena da região. A coleta de dados censitários comprovou a pluralidade étnica da cidade de Altamira.
O Instituto Humanitas constatou a existência de 277 famílias indígenas, reunindo 1,4 mil pessoas. Essas famílias, que vivem em 18 bairros de Altamira, pertencem a 17 etnias diferentes. Elas podem ser agrupadas em seis famílias lingüísticas: Tupi (Anambé, Guajajara, Guarani, Juruna, Laiowá, Kayabi, Kuruaya, Munduruku, Parakanã, Xipaya e Tupinikin), Jé-Kayapó (Kayapó e Xikrin), Jê-Timbira (Kanela), Macro-Jê (Karajá), Karib (Arara e Makuxi), Aruak (Baré). Até então, eles não tem a sua origem étnica reconhecida oficialmente pelos os órgãos governamentais.
“O mosaico indígena urbano de Altamira guarda em comum uma trajetória social de violência e exploração”, afirma o relatório do Instituto Humanitas. Os casos mais dramáticos se verificam entre as 65% das famílias, que não são reconhecidas nem mesmo pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e permanecem excluídas dos programas especiais do governo, especialmente relacionados à saúde. Quando são presos, são tratados como criminosos comuns, sem assistência jurídica diferenciada. A Funasa não reconhece 80% delas. Essas famílias são as mais pobres de Altamira e, por estarem geograficamente distantes das suas aldeias de origem, seus vínculos culturais foram enfraquecidos.
Rangel responsabiliza a ocupação branca dos anos 70 e a falta de políticas públicas de assistência ao índio pela situação. O processo de urbanização forçou a emigração de muitos indígenas para locais afastados e de difícil acesso. Àqueles que restaram coube uma forte imposição da cultura branca. “O não registro civil dessa população é conseqüência de um processo histórico de dominação e violência que não permitiu e desestimulou a sua inclusão”, verifica o Instituto Humanitas.
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Saiba mais sobre o projeto Irema, apoiado pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos, que trata da discirminação e do racismo instituticional. (Projeto IREMA)