Rute Fiúza é mãe de Davi, um adolescente de 16 anos que desapareceu no bairro São Cristovão, em Salvador (BA), no dia 24 de outubro de 2014. A família acredita que ele foi sequestrado e morto por policiais militares. A investigação oficial ainda não foi concluída, mas Davi tornou-se um símbolo da violência institucional que atinge principalmente jovens negros moradores das periferias brasileiras.
A mãe não aceita que ele seja apenas mais um. Por isso, luta ao lado de outras mulheres que também perderam os filhos para a violência ou enfrentam as consequências da política de superencarceramento no país. Ela faz parte do Odara – Instituto da Mulher Negra, organização que combate o racismo, sexismo, lesbofobia e todas as formas de intolerância para garantir a liberdade, a autonomia e o bem-viver das mulheres negras e seus familiares.
“De alguma forma, eles também nos sequestram. Sequestram os nossos sonhos, os planos que a gente tinha”, afirma Rute sobre o desaparecimento do filho.
Ela foi uma das participantes do seminário “Das Juventudes à Mulherada – Prisões e (In) Justiças”, realizado na última semana de abril em Fortaleza (CE) com o apoio do Fundo Brasil. O seminário buscou dialogar e sensibilizar o sistema judiciário e a sociedade sobre a ineficácia do encarceramento em massa da população brasileira, com ênfase nas mulheres, assim como na questão da não implementação de medidas previstas no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e no Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo).
Mônica Cunha é mãe de Rafael da Silva Cunha, adolescente que passou pelo sistema socioeducativo do Rio e foi morto aos 20 anos por um policial civil. Fundadora e coordenadora do Movimento Moleque, ela acusa o estado de ser o maior violador de direitos de moradores das favelas e das periferias.
“Meu filho foi uma prova de que o encarceramento não ressocializa de maneira nenhuma. A medida socioeducativa é muito bonita no ECA, mas ainda não é praticada. E isso levou meu filho a ser assassinado”, diz.
Mônica também participou do seminário no Ceará e, em entrevista ao Fundo Brasil, defendeu que o estado pare de entrar nas favelas e periferias apenas com o seu braço armado.
“Nós também queremos respeito. Por que não podemos parir e criar nossos filhos? Ver nossos filhos rapazes, casados? Ver nossos netos? Que democracia é essa? Não chegou para a gente ainda. Basta de tantos assassinatos, de racismo”.
Na quinta-feira, dia 26, as mães presentes ao evento participaram de uma atividade de intercâmbio para troca de experiências e realizaram um ato público em frente à Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo. Por meio da manifestação, elas conseguiram ser recebidas para uma audiência com o superintendente, Cássio Silveira Franco.
O seminário/intercâmbio foi organizado pelo Inegra – Instituto Negra do Ceará; pelo Cedeca – Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará; pelo Grupo de Mulheres e Familiares de Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa; e pelo Nuafro – Laboratório de Estudos e Pesquisas em Afrobrasilidade, Gênero e Família. Os três primeiros grupos são apoiados pelo Fundo Brasil.
Fundo Brasil
O Fundo Brasil é uma fundação independente, sem fins lucrativos, que tem a proposta inovadora de construir mecanismos sustentáveis para destinar recursos a defensores e defensoras de direitos humanos em todas as regiões do pais.
A fundação atua como uma ponte, um elo entre organizações locais e potenciais doadores de recursos. Já destinou R$ 12 milhões a cerca de 300 projetos em todas as regiões do país. Além da doação de recursos, os projetos selecionados são apoiados por meio de atividades de formação e visitas de monitoramento que fortalecem as organizações de direitos humanos.
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