Logo no início do documentário Porque Temos Esperança, em que sua história é contada, Marli Maravilha da Silva afirma que o seu grande acerto na vida é o trabalho realizado na Apemas (Associação Pernambucana de Mães Solteiras), a organização que criou em 1991 quando seu único filho ainda era um bebê. Abandonada pelo pai da criança, Marli luta há quase três décadas pelos direitos de mulheres que vivem situações parecidas com a dela.
“Quem enxuga as lágrimas dos outros não tem tempo de chorar”, reflete ao falar sobre questões de sua vida pessoal. “A gente escuta tantos problemas dos outros que o nosso não é nada”.
Marli sofre com as mães que criam os filhos sozinhas; com os filhos que não têm pai; com as mulheres cujos filhos estão presos. Ela chora sim, mas essa não é a única reação. Além de ficar comovida e ouvir todas as histórias, a fundadora da Apemas trabalha muito para garantir a paternidade de crianças e possibilitar o fortalecimento de vínculos afetivos e familiares.
Um novo capítulo dessa história será escrito neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, quando a Apemas lança em Recife a campanha “Paternidade Além das Grades”, apoiada pelo Fundo Brasil por meio do edital anual 2016. A campanha, realizada em parceria com a OAB-PE, levará os cartórios para dentro do sistema prisional de Pernambuco para registrar os filhos de detentos e assegurar o direito ao reconhecimento de paternidade.
“Graças ao Fundo Brasil teremos a oportunidade de dar a condição para as mães regularizarem a situação dos seus filhos”, diz Marli. “Para nós, mães, não existe presente maior do que ver nossos filhos bem”.
O Fundo Brasil faz parte da trajetória da Apemas. E vice-versa. A associação recebeu o apoio em 2007; foi apoiada novamente em 2011 e 2016.
A Apemas trabalha com a comunidade carcerária em um contexto em que a falta de reconhecimento legal de crianças impede os pais presos de receberem as visitas dos filhos e também em que muitas mães deixam de registrar seus filhos enquanto os companheiros estão encarcerados. A organização também atua junto a mulheres presas que não têm como lutar sozinhas pelos direitos de suas crianças.
Debates, seminários e reuniões com as comunidades carcerárias e seus familiares possibilitam a troca de informações e a sensibilização sobre a importância do registro legal.
Marli costuma conversar com as presas e os presos. Nessas oportunidades, conta um pouco sobre a sua experiência e relata as dificuldades de criar um filho sem a presença paterna. Também informa que o trabalho da Apemas já possibilitou a resolução de 50 mil processos de paternidade
A exibição do documentário Porque Temos Esperança é uma das ações de sensibilização para o reconhecimento da paternidade. O filme conta histórias como a de Gleison, que registrou o filho enquanto estava preso após campanha da Apemas. Ao mesmo tempo, ele foi reconhecido como filho pelo padrasto, que o criou em parte da vida.
“Acreditamos que hoje 70% dos presos têm filhos sem registro”, informa Marli. Muitos, como Gleison, também não contam com a presença dos pais biológicos desde a infância.
“Temos centenas de Gleisons”, afirma um dos agentes penitenciários entrevistados no documentário. “São pais que querem registrar seus filhos e encontram dificuldades”.
Outra história é a de Alessandra, uma mulher presa que contou com a Apemas para conseguir o registro paterno para o seu filho. O pai da criança também estava preso e assinou a certidão de nascimento após campanha realizada pela organização.
As assinaturas da mãe e do pai da criança foram colhidas nos presídios em que cada um está. Além do registro, a Apemas atuou para reaproximar a família do homem preso, afastada por causa da prisão.
Reconstruir laços, apesar das grades, é hoje a especialidade de Marli.
Serviço
Lançamento da campanha “Paternidade Além das Grades”
Dia 8, às 10h
Auditório da OAB-PE – rua Imperador Pedro Segundo, 235, Santo Antônio – Recife (PE)
Veja aqui a história de Marli contada na revista “Brasil de Direitos”, que comemorou os dez anos do Fundo Brasil.