A agenda do trabalho tem incorporado cada vez mais as questões ambientais, com trabalhadores e suas representações dedicando maior atenção a temas como mudanças climáticas, descarbonização, aquecimento global e transição energética. Essa preocupação é particularmente notável entre as categorias profissionais que vivenciam de maneira mais direta os impactos das transformações ambientais em seus ofícios e condições de trabalho.
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) vem expandindo essa discussão para outras categorias de trabalhadores, buscando fortalecer a articulação entre sindicatos e movimentos sociais. Com o apoio do Labora – Fundo de Apoio ao Trabalho Digno via Carta Convite, o DIEESE e as Centrais Sindicais têm se articulado desde o ano passado em torno de uma agenda unificada de lutas. E nesta semana iniciaram mais uma edição da Jornada Nacional de Debates.
O evento, que teve início dia 9 de abril, está sendo realizado nas capitais dos 17 estados onde o DIEESE possui escritórios, tendo como tema central “Trabalho, meio ambiente e transição justa – rumo à COP 30“. O DIEESE busca impulsionar o movimento sindical em processos de transição justa, nos quais os trabalhadores e trabalhadoras estejam no centro do debate sobre as emergências climáticas, e consolidar um novo modelo de desenvolvimento que equilibre os aspectos sociais, ambientais e econômicos.
Durante a mesa de abertura do debate, Amanda Camargo, coordenadora do Labora, ressaltou a importância de incluir a voz dos trabalhadores nas discussões sobre a crise climática e a transição justa. ”Estão faltando trabalhadores e trabalhadoras na mesa das negociações climáticas, nas construções de políticas públicas; por isso, o Labora busca fortalecer a iniciativa das centrais sindicais de ocupar esse lugar na mesa com propostas próprias, com soluções próprias e fazer avançar a agenda da transição justa do ponto de vista da classe trabalhadora.” Amanda também apontou sobre a importância da Filantropia de Justiça Social olhar com mais atenção para a pauta da transição energética justa no contexto brasileiro por meio do apoio às organizações de base.

Abertura da Jornada Nacional de Debates. Foto: Mariana Silveira/Acervo Fundo Brasil
Jornada Nacional de Lutas
Os debates fazem parte da Jornada Nacional de Lutas, articulada pelo Fórum das Centrais Sindicais, sob o lema “Por um Brasil Mais Justo: Solidário, Democrático, Soberano e Sustentável”. A jornada irá culminar na Marcha da Classe Trabalhadora a Brasília, no dia 29 de abril, com a entrega de um documento de reivindicações da classe trabalhadora ao governo, contendo pautas como a redução da jornada sem redução de salários e a participação da classe trabalhadora na agenda climática. Além disso, a Jornada Nacional traz um resgate histórico do Dia do Trabalhador e um debate com suas diversas bases, em preparação para as marchas de 1º de maio.
Participaram da mesa de abertura do debate Adriana Marcolino, diretora técnica do DIEESE; José Gonzaga da Cruz, presidente do DIEESE; Paulo de Oliveira, secretário nacional da Central dos Sindicatos Brasileiros; Nailton Francisco de Souza, diretor nacional de comunicação da Nova Central Sindical Trabalhadores Estado de São Paulo; Marie Claire, da Pública Central Sindical dos Servidores Públicos; Nilza Pereira, Secretária-Geral da Central Intersindical; Adilson Araújo, Presidente da Central de Trabalhadores do Brasil; Canindé Pegado, Secretário Geral da União Geral dos Trabalhadores; João Carlos Gonçalves (Juruna), Secretário-Geral da Força Sindical; Juvandia Moreira, Vice Presidenta da Central Única dos Trabalhadores.

Mesa de Abertura da Jornada Nacional de Debates, Dieese 2025. Crédito: Sebastian Cauvet
Como conciliar a proteção ambiental com a geração de renda e trabalho digno
O debate principal se deu em como conciliar a proteção ambiental com a geração de renda e trabalho decente.
Segundo o DIEESE, para reverter esse quadro, é fundamental incentivar setores sustentáveis com potencial de geração de emprego digno, como saneamento básico, agricultura orgânica, energias renováveis, regeneração de áreas degradadas, biocombustíveis, o complexo industrial da saúde, turismo ambiental e a bioeconomia.
Logo após a mesa de abertura, Adriana Marcolino se aprofundou sobre os impactos alarmantes das mudanças climáticas no abastecimento de alimentos e, crucialmente, nas condições de trabalho no Brasil.
A análise do DIEESE revela um cenário de crescente vulnerabilidade para os trabalhadores, expostos a altas temperaturas e seus efeitos negativos, enquanto a transição para uma economia mais sustentável esbarra em desafios para garantir condições dignas de trabalho.
O estresse térmico nos ambientes laborais

Abertura da Jornada Nacional de Debates. Foto: Sebastian Cauvet
Outro ponto muito levantado durante a Jornada fez referência ao relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 2019, o qual alertava que os locais de trabalho não estão preparados para ondas de calor extremas, afetando desproporcionalmente regiões com alto índice de informalidade e falta de proteção social, como o Brasil.
Dados do Ministério do Trabalho corroboram essa tendência, com um salto impressionante nas denúncias de estresse térmico, de 154 em 2022 para 741 em 2024. Paralelamente, observa-se um aumento nas notificações de transtornos mentais relacionados ao trabalho, impactando a saúde dos trabalhadores, especialmente as mulheres, uma vez que altas temperaturas elevam os níveis de cortisol, o hormônio do estresse. As chamadas “greves ambientais” no Brasil, entre 2007 e 2022, já sinalizavam essa preocupação, com demandas centradas em circulação de ar, calor e fornecimento adequado de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), incluindo protetor solar.
Segundo o DIEESE, as negociações coletivas ainda engatinham na incorporação de cláusulas ambientais, representando apenas 1,5% do total. Na visão das Centrais e também do DIEESE, ampliar essas cláusulas é essencial para proteger os trabalhadores na transição ecológica. Isso envolve um diálogo social robusto, um plano de desenvolvimento integrado, a interação com as comunidades afetadas, além da disponibilidade de financiamento e políticas públicas. Confira, neste link, datas, horários e os demais locais da Jornada Nacional de Debates.
Confira algumas reflexões levantadas pelas lideranças sindicais:
Juvandia Moreira, Vice Presidenta da CUT:
“A COP é um evento importantíssimo para o mundo todo, e principalmente neste momento que estamos vivendo com o Trump abandona as questões ambientais, tira os Estados Unidos do debate, porque não quer se comprometer. É o país que mais consome no mundo, e consome inclusive recursos naturais, prejudicando o meio ambiente. Nós temos que estar organizados com as nossas pautas, temos que ter a pauta da classe trabalhadora nessa COP. Ela não pode ser feita apenas pelos governos ou apenas pelos empresários. Nós existimos e temos que brigar para estarmos presentes em todas essas negociações, discutindo esses temas que são essenciais para o nosso presente e para o nosso futuro”.
Nailton Francisco de Souza, Nova Central Sindical Trabalhadores Estado SP:
“O transporte tem muito a ver com a questão da sustentabilidade do meio ambiente nas cidades. No exemplo de São Paulo, a chegada dos ônibus elétricos, ônibus ecológicos, não aconteceu porque o prefeito é bonzinho, mas representa uma luta do movimento sindical, uma luta dos trabalhadores do transporte. Nós temos leis na Câmara Municipal do Estado de São Paulo aprovadas com esse viés. O sindicato dos motoristas e trabalhadores do transporte da cidade sempre lutou pela melhoria das frotas, a melhoria dos ônibus, para dar condições de trabalho para nossos profissionais e também melhorar o meio ambiente da cidade, com ônibus menos poluentes.”
Nilza Pereira, Secretária-Geral da Central Intersindical:
“A transição justa (TJ) na opinião da Intersindical, passa por um novo pacto civilizatório. Não tem como a gente falar de TJ e meio ambiente se nós continuarmos no mesmo padrão de produção e consumo (…) A nova classe trabalhadora, que está discutindo o fim da escala 6×1,ela quer discutir padrão de vida, ela quer discutir uma melhor qualidade de vida. Se a gente não olhar pra eles, a gente não vai conseguir discutir isso com ninguém.”
Canindé Pegado, Secretário Geral da União Geral dos Trabalhadores:
“O desafio é o seguinte, para quem é dirigente sindical: colocar nas pautas das convenções coletivas do trabalho cláusulas relacionadas à temática da transição justa.”
João Carlos Gonçalves (Juruna), Secretário-Geral da Força Sindical:
“O DIEESE está coordenando, através dos escritórios regionais, atividades de debate sobre a nossa luta, sobre as questões atuais, e lá nossas estaduais e todas as centrais vão estar trabalhando de forma unificada para que no dia 29 de abril a gente possa, em Brasília, fazer a Caminhada dos Trabalhadores e, ao mesmo tempo, apresentar um documento com nossas pautas.”