Nilcéa Freire, Paulo Vannuchi e Roberto Nogueira cumpriram o papel de traçar um panorama geral dos direitos humanos no país na quarta noite do Ciclo de Debates Direitos Humanos e Desenvolvimento, sexta-feira, 9 de dezembro. O encontro marcou o encerramento das discussões propostas para antecipar o Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado em 10 de dezembro, e comemorar os cinco anos de operação do Fundo Brasil de Direitos Humanos.
Ministro de Direitos Humanos no Governo Lula, entre 2005 e 2010, hoje diretor do instituto que leva o nome do ex-presidente petista, Paulo Vannuchi fez uma avaliação da importância do Plano Nacional de Direitos Humanos – PNDH, que teve sua primeira versão elaborada ainda no Governo FHC. Segundo ele, a iniciativa demonstrou pela primeira vez uma preocupação do Estado em criar uma política pública para todos os ministérios com foco garantia dos direitos humanos.
Paulo Vannuchi fez questão de destacar que o Fundo Brasil atualmente se incorpora ao panorama dos direitos humanos no País como uma iniciativa inovadora que apoia diferentes ações e as mais diversas temáticas dentro desse campo. Segundo ele, é exatamente essa diversidade que escapou do debate do PNDH 3, no ano passado.
A polêmica na aprovação do plano passou pela dificuldade da opinião pública enxergar os direitos humanos para além das questões penitenciárias.
Ele também destacou o avanço com relação à criação da Comissão Nacional da Verdade e defendeu que a proposta não é necessariamente punir os que agiram em nome do Estado, mas fazer o processamento dessas informações e quebrar a impunidade, impedindo a perpetuação de outras violências como extermínio indígena e da população negra, escravidão, etc, conforme colocou. Já neste ano, a criação dos observatórios universitários que poderão pesquisar localmente violações de direitos humanos no período da ditadura militar e, conforme previsto no plano, podem multiplicar o poder da comissão de desvelar o que ocorreu no passado.
O PNDH 3 também foi o foco da representante da Fundação Ford no escritório do Rio de Janeiro, Nilcéa Freire. A primeira questão tratada por ela foi exatamente os avanços que podem ser alcançados na defesa do direito à memória e à verdade, com a participação da sociedade civil organizada na luta pela efetivação dos encaminhamentos propostos.
Nilcéa Freire também abordou a problemática da defesa dos direitos reprodutivos. Desde que atuou como ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, no Governo Lula, ela tomou consciência da dificuldade de levar adiante esse debate. O conservacionismo impediu até mesmo uma abordagem acerca do aborto enquanto questão de saúde pública, como lembra.
Por fim, ela mencionou o direito à terra e à vida em cidades justas e sustentáveis; e os direitos dos sub-representados, como mulheres, indígenas, afrodescendentes. Em ambos os casos, Nilcéa reconhece avanços, mas pondera que o país continua muito desigual e excluindo grande parcela da população. O desafio é exatamente pensar em um desenvolvimento que respeite os direitos humanos.
O pesquisador da Diretoria de Estados, Instituições e Democracia do Ipea, Roberto Nogueira, apontou que o desenvolvimento vem sendo historicamente associado ao período do governo autoritário do país, sempre visto sob a ótica da elite para a elite. Sob o ponto de vista dele, o Brasil não será um país industrial de ponta, mas também não pode ser apenas de fazendas e maquiladoras; e, para explorar os recursos naturais, terá de atentar para a garantia dos direitos humanos e garantir a sustentabilidade de projetos nesse ramo. No entanto, como ele pondera, poucos economistas colocam na balança a garantia de direitos fundamentais como fator de desenvolvimento.
Os participantes revelaram ser essencial desconstruir a ideia de que direitos humanos são apenas “direitos de bandidos”, revelando uma abordagem mais ampla, como por exemplo, além dos demais já citados, o direito das populações tradicionais e LGBT, entre outras. A educação é apontada como caminho para construir essa nova cultura.
O Ciclo de Debates foi realizado pelo Fundo Brasil, em parceria com o Grupo Editorial Summus e a Livraria Cultura Bourbon Shopping, palco das discussões. Nas três primeiras noites foram tratados os seguintes temas, respectivamente: “Combate à homofobia”, “Equidade racial” e “Impacto da Copa e de grandes projetos de infra-estrutura”.