O dia 3 de agosto ganhou um novo significado para os movimentos organizados LGBTQIA+ da cidade de Crato, no Cariri Cearense. Em setembro do ano passado, o município, a 542 km de Fortaleza, sancionou a lei 3840/2021, que estabelece a data no calendário como Dia Municipal do Orgulho LGBT.
A iniciativa faz parte da luta de comunidades LGBTs em Crato contra o preconceito e a discriminação e pela garantia de direitos. O 3 de agosto foi escolhido em alusão à lei 17.599, que reconhece a Associação de Defesa, Apoio e Cidadania dos Homossexuais de Crato e Região do Cariri – ADACHO CARIRI pelos serviços de utilidade pública no Ceará. Esta foi a primeira organização do Estado a receber a honraria.
“Vemos isso como um reconhecimento da nossa luta, que não começou hoje e não vai parar. Muitos direitos foram conquistados por nós na construção de uma sociedade mais humanizada e consciente. Mas esse é só o início”, diz André Lacerda, presidente e fundador da ADACHO.
Para o trabalho de incidência política e fortalecimento institucional, a organização contou com o apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos, por intermédio dos recursos disponibilizados no edital geral 2021 – Seguir com Direitos.
“Ter um projeto apoiado pelo Fundo Brasil foi de suma importância para ADACHO, porque a gente pôde fortalecer a nossa população LGBTQIA+ e desenvolver ações de educação e formação sobre direitos humanos. Além de nos impulsionar para a busca de mecanismo para a produção de propostas de leis que foram aprovadas”, explica André Lacerda.
Violência contra pessoas LGBTQIA+ no Ceará
Dados do Dossiê de Mortes e Violências Contra LGBTI+ no Brasil, em 2021, apontam que somente no estado do Ceará, mais de 20 pessoas LGBTQIA+ foram mortas por causa do ódio à diversidade no ano passado. Dentre as vítimas estão onze mulheres trans ou travestis. Este é o maior número de assassinatos do tipo entre os estados monitorados.
Para André Lacerda, as violências sofridas no interior cearense são ainda piores por diferentes motivos.
“A gente já se assusta com os números dos casos de violências contra LGBTs em grandes cidades. Agora, imagine como é difícil viver em uma cidade pequena, no sertão brasileiro, que é machista, onde a população tem menos acesso à informação, tecnologia e enfrenta diferentes vulnerabilidades sociais. Temos que lutar em dobro por nossa sobrevivência”.
Por isso, além do Dia Municipal do Orgulho LGBT, a ADACHO encaminhou outra proposta à Câmara Municipal, para estabelecer o dia 20 de novembro como o Dia Municipal de Luta contra a LGBTFobia. O pedido também foi aprovado.
“Escolhemos essa data, porque marca o dia do assassinato considerado de grande repercussão em Crato e um crime de ódio, que tirou a vida do cabeleireiro Edval Carvalho. Esse é apenas um dos casos. Nossos direitos são violados em todos os lugares do Brasil. Mas aqui sentimos a ausência desse olhar para nossa realidade diariamente. Por isso, estamos trabalhando para efetivar políticas para reduzir os índices de crimes e violências contra a população LGBT”, completa o ativista.
Semana da Diversidade LGBT reúne 12 mil pessoas
Neste primeiro ano de implementação, o Dia Municipal do Orgulho LGBT foi comemorado, entre os dias 03 e 13 de agosto. A primeira ação foi a entrega do Selo Crato da Diversidade, feita pela Assessoria de Políticas Públicas para LGBTs da prefeitura.
A honraria tem como objetivo homenagear empresas que adotam políticas de inclusão ou pessoas que contribuem para a promoção da proteção dos direitos humanos da população LGBT.
A Semana da Diversidade ainda incluiu passeata, ato político, palestras e oficinas sobre direitos humanos, além da 17ª Parada da Diversidade LGBT, realizada em 13 de agosto. O ato começou com uma caminhada pela liberdade do amor, pela vida e por um Crato mais inclusivo, sem preconceitos e discriminação, que partiu da Praça do DETRAN até o largo da RFFSA, onde aconteceu o Grande Show da Diversidade.
Segundo a ADACHO, mais de 12 mil pessoas participaram das ações em torno das comemorações.
“Ver a consolidação desse evento foi como materializar um sonho, que estava guardado com a gente há muitos anos. Nossa luta não é suficiente para superar séculos de preconceito e intolerância, mas cada gesto, por menor que seja, é essencial para lembrar que somos todos humanos e merecemos viver”, emociona-se o ativista.
ADACHO: 18 anos pela diversidade LGBTQIA+
Associação de Defesa, Apoio e Cidadania dos Homossexuais do Crato e Região do Cariri – ADACHO CARIRI, é uma entidade que trabalha, há 18 anos, para orientar e lutar pelos direitos fundamentais da população LGBTQIA+, garantindo acesso à saúde, educação, cidadania e cultura.
“Acreditamos que somente por intermédio deste fortalecimento, os índices de violência, discriminação e mortes, que afetam estas pessoas na região de Crato e Cariri podem mudar. Nosso objetivo é fortalecer a população LGBT nos princípios da amizade, união, respeito, inclusão e solidariedade humana”, enfatiza André.
A ADACHO é a segunda entidade LGBT mais antiga do Ceará e a primeira a ter Utilidade Pública reconhecida pela Assembleia Legislativa. “Os programas e as iniciativas da organização, no decorrer desses anos, podem ser considerados como ‘pontapés’ para o início da discussão e da garantia de direitos da população LGBTQIA+, que ainda carecem de um olhar mais cuidadoso para suas pautas”, finaliza o ativista André Lacerda.
Seguir com Direitos
Este foi o 14º edital geral do Fundo Brasil. Esta é uma linha de apoio mais abrangente da fundação, que contempla uma diversidade ampla de causas e estratégias para o enfrentamento às violências institucionais e às diversas formas de discriminação.
O edital 2021 – Seguir com Direitos apoiou 20 organizações com o valor de até R$ 40.000,00 para ações em defesa dos direitos das mulheres; de enfrentamento ao racismo; de direitos de povos indígenas; de populações quilombolas e tradicionais; cidades justas e sustentáveis; livre orientação sexual e identidade de gênero; terra e território; e garantia do estado de direito.